A condição de cidadãos exige que sejamos autônomos, críticos e
participativos em nossa comunidade. O município é o lugar onde moramos e
construímos nossa história no cotidiano do trabalho ou nas horas de lazer e entretenimento.
Certamente, será o lugar onde morreremos também.
O ser humano, como sujeito biológico e cultural, deve inscrever na
sua identidade terrena, uma consciência ecológica de que nos fala Edgar Morin,
de “habitar, com todos os seres mortais, a mesma esfera viva... a
consciência cívica terrena... da responsabilidade e da solidariedade para com
os filhos da terra”. E é essa minha consciência ecológica me instiga a
fazer alguns questionamentos:
Qual modelo ideal de cidade desejo para minha família e para as
futuras gerações? Se não posso viver na cidade ideal, como seria a cidade capaz
de me proporcionar bem estar e qualidade de vida? A cidade onde moro oferece
itens, como segurança, educação, saúde, comércio, lazer, dentre outros, com
qualidades razoáveis para a boa convivência humana? Devido às limitações deste
artigo, deter-me-ei em apenas dois itens para testar o “bom viver” da cidade
onde moro: segurança e lazer.
Itabuna, cidade com mais de 220 mil habitantes e polo comercial da região sul
da Bahia, possui uma das taxas de criminalidade mais alta do estado, tendo
ocupado o topo do ranking nacional como a cidade mais violenta para
adolescentes entre 12 a 18 anos, nos anos de 2009 e 2010, conforme dados
oficiais da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Os delitos ocorrem invariavelmente no centro da cidade em
plena luz do dia. Estamos inseguros, e essa sensação de insegurança é
potencializada pelo sensacionalismo midiático que se encarrega de espalhar o
clima de terror e pânico na cidade.
Quais discursos, quais ações podem ser implementadas para
mudar esse quadro sombrio? Nas reuniões de segurança pública, o discurso para
tomada de iniciativas sempre é o mesmo: mais armamento, mais viaturas, mais
prisões. O presídio de Itabuna está atualmente com mais de 1.200 presos, quando
a unidade comporta apenas 440. É uma bomba relógio que deverá explodir a
qualquer momento.
Na verdade, não tenho a receita pronta, mas posso afirmar
que há necessidade de um novo paradigma de segurança pública no país, e para
isso, é preciso vontade política que rompa muitas resistências naturais visando
a manutenção das atuais estruturas.
Enquanto o novo paradigma não vem, o jeito é apostar
na prevenção, implementando projetos sociais para crianças, adolescente e
jovens, abrindo escolas nos bairros nos finais de semana, criando espaços para
a prática do esporte e lazer, valorizando nossas praças públicas. Uma praça pública
bem iluminada, com espaço para o lazer, com banheiros públicos higienizados,
constitui uma janela aberta para a segurança, pois certamente atrairá
aglomeração de famílias e assim afastará os meliantes. Ao contrário, uma praça
pública mal iluminada, sem atrativo e abandonada, passa a se transformar num
foco de marginais e usuários de drogas. É o que acontece com a Praça da
Catedral de Itabuna, que há algum tempo não vem merecendo a devida atenção do
poder público e hoje, é ponto de encontro de usuários de drogas, sendo cenário
de vários delitos, como furtos e roubos. O mesmo acontece com a Praça do Bairro
Santo Antônio, ponto de encontro de usuários de drogas.
Foi valorizando os logradouros e praças públicas, que o
prefeito de Nova York em 1994 aplicou a teoria das janelas quebradas, reduzindo
drasticamente os índices de criminalidade naquela cidade.
Outro ponto que merece destaque é o espaço com a oferta de
lazer, para a prática de esportes, atividades lúdicas e culturais. O sociólogo
Domenico de Massi em seu livro “Ócio Criativo” afirma que dispomos de mais de
300 mil horas livres para exercitar a nossa criatividade, seja no esporte, na
ginástica, na cultura, na meditação, na interação com as pessoas, no amor
ou no convívio com a família.
Passado o período da revolução industrial, onde o
trabalho cansativo e de montagem ocupava o papel principal, valoriza-se hoje, o
tempo livre, pois o ócio criativo é o que, de fato, acaba dando sentido às
nossas vidas.
O grande problema é que olhando para a minha cidade, vejo
o rio Cachoeira agonizando sem que haja uma intervenção eficiente por parte do
Poder Público, muito embora existam projetos, como o “Centro das águas”
capitaneado pela professora Maria Luzia de Mello, que oferece estratégias para
salvar o inditoso rio, cantado em verso e prosa por Cyro de Mattos, Lurdes
Bertol e tantos outros escritores.
O itabunense normalmente gosta de andar, correr e pedalar
na avenida Beira Rio; entretanto, o piso é acidentado e estreito, a iluminação
é sofrível e o mau cheiro que exala do rio é insuportável. É incrível que uma
cidade como Itabuna não possua um projeto para melhorar a qualidade de vida das
pessoas. O que se observa são algumas e poucas iniciativas particulares que
acabam dando um novo colorido à cidade, como o futvólei e outras atividades
físicas praticadas na Praça Aziz Maron .
Nos finais de semana alguns esportistas são obrigados a
interditar algumas vias da Avenida Beira Rio para praticar atividades físicas
nos finais de semana e feriados sem o risco de serem atropelados por algum
veículo. Indaga-se: por que o Poder Público não transforma a Praça Aziz Maron
num local aprazível, construindo uma arena moderna com vestiário e instrumentos
de ginástica para a prática de esportes diversos?
Por que não realizar um projeto em torno da Avenida Beira
Rio, alargando o passeio, melhorando a iluminação pública, construindo
quiosques no seu entorno, oferecendo melhor espaço às pessoas que praticam
atividades físicas e àquelas que transitam pelo local?
Por que não criar na cidade, pelo menos nos finais de
semana e feriados, ciclovias móveis com cones, a exemplo do que já ocorre em
grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, para as pessoas
pedalarem?
Por que não revitalizar efetivamente essas praças
públicas? Por que não utilizar o conhecimento científico das universidades e do
projeto “Centro das Águas” para salvar o Rio Cachoeira? Precisamos não só
de justificativas, mas de ações que transformem nossa cidade num lugar
aprazível para vivermos.
Enfim, como cidadão itabunense, sou obrigado a
exercer meu senso crítico no sentido de que a reflexão possa contribuir para
que a cidade onde moro e moram milhares de pessoas, possa oferecer a
todos uma melhor qualidade de vida, pelo menos, no que tange à segurança, lazer
e entretenimento, tornando-se assim, mais humanizada.
Marcos Bandeira é advogado, Juiz aposentado, Professor de Direito da
UESC e ex-presidente da Academia de Letras de Itabuna.